quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

A Menina que Roubava Livros

por Maria Clara


Alguns livros são fáceis de resenhar: é possível lê-los e, ainda que a história emocione, você continua capaz de alcançar um distanciamento antes de escrever sobre eles. Esse não é um desses livros, pelo menos para mim, mas fiz o máximo para não deixar que a emoção afetasse a resenha.



Na Alemanha, em um trem a caminho da cidade de Molching, Liesel Meminger vê o irmão morrer e, no enterro do menino, rouba um livro de um coveiro do cemitério. A "A Menina que Roubava Livros", de Markus Zusak, já apresenta a protagonista na atividade que a define - ao longo da vida, o interesse pela leitura e o hábito de surrupiar aquilo que deseja ler terão forte influência sobre o que acontece com a garota.

Em Molching, Liesel é adotada por Hans e Rosa Hubermann, aprende a ler e a amar as palavras. Ali, ela também começa a compreender o Nazismo e os motivos para ter sido deixada pela mãe, de forma que o romance traz parte da Segunda Guerra Mundial sob o olhar de uma criança. Bastante inteligente e sensível, a protagonista percebe que as palavras que tanto a encantam durante a leitura são o mesmo material que permite a situação de tensão no país. Ao mesmo tempo, ela se entrega aos livros e cria sua própria relação com essas palavras, bem como com a família e os vizinhos.

Liesel é uma personagem cativante, mas está longe de ser a única a envolver o leitor. Seus pais adotivos, Hans e Rosa, são um casal formado quase por opostos: enquanto ele é a imagem da calma e sabedoria, transmitindo segurança para a menina, ela é enérgica e determinada, raramente capaz de demonstrar carinho de uma forma mais tradicional (esqueça beijos e abraços afetuosos, quando se trata da alemã). Ainda assim, os momentos que mostram a profundidade emocional de Rosa e o quanto ela já sofreu são tocantes, e não há como não simpatizar com a mulher. Rudy Steiner, vizinho de Liesel, e Max Vandenburg, o judeu que chega à casa no meio de uma noite, também trazem suas próprias histórias de sonhos e sofrimento, criando forte amizade com a garota.

Se a protagonista do livro encanta, é na narração que Zusak conquista definitivamente. A história é contada pela Morte, que se mostra uma narradora eficiente e sensível. Dedicada a seu trabalho de recolher as almas - portanto, extremamente ocupada em plena guerra -, ela passa pela vida de Liesel três vezes, e acha a menina marcante. Cansada, ela não tenta fazer mistério sobre acontecimentos futuros do enredo, conta tudo da forma mais direta possível e fala tanto daquilo que viu quanto das situações que apenas Liesel presenciou (ela encontrou um livro em que a menina escreveu sua história, e já leu inúmeras vezes até ter a ideia de contar tudo ao leitor).

É complicado falar sobre "A Menina que Roubava Livros" sem dar algum spoiler ou esconder o quanto o livro faz com que o leitor se envolva - acaba-se tendo a sensação de que a resenha não foi bem feita. É o tipo de obra que merece ser lida várias vezes, e que dificilmente deixará de cativar o público. O livro ganhou uma adaptação para o cinema que estreia na sexta-feira (31), com Sophie Nélisse no papel de Liesek, Geoffrey Rush como Hans e Emily Watson como Rosa Hubermann. A direção é de Brian Percival, e o filme concorre ao Oscar de Melhor Trilha Sonora.




"A Menina que Roubava Livros" foi publicado pela editora Intrínseca. Para adicioná-lo à sua estante no Skoob, clique aqui.

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Will & Will - Um nome, um destino

por Maria Clara


Will Grayson é um adolescente comum, embora um pouco tímido, e melhor amigo de Tiny Cooper, "a maior pessoa do mundo que é muito, muito gay, e também a pessoa mais gay do mundo que é muito, muito grande".

Já Will Grayson é outro adolescente comum, embora deprimido, bastante fechado e pessimista, que mora com a mãe e só encontra felicidade no relacionamento virtual que mantém com outro menino.

Os dois garotos não se conhecem, e a única coisa que têm em comum é o nome. Certa noite, por acaso, eles acabam se encontrando, e é aí que a vida de um começa a interferir na vida do outro. Mas se engana quem pensa que os dois passaram a interagir durante o livro inteiro - os dois protagonistas praticamente não se encontram até os últimos momentos da história.

O elemento que faz a integração entre os dois é Tiny Cooper: depois que um Will Grayson sofre uma desilusão amorosa, ele se aproxima do garoto, e os dois começam a sair juntos. Esse relacionamento faz com que Tiny se afaste um pouco de seu melhor amigo, o outro Will Grayson, que tenta engatar um namoro com a colega Jane.

Entre nomes iguais e relacionamentos complicados, o livro de John Green e David Levithan acaba por se mostrar uma história sobre a amizade e a importância que ela tem na vida dos personagens principais. O valor dado aos amigos, a importância de atos capazes de demonstrar carinho e atenção e a disposição em se abrir para as pessoas - esses são os elementos que realmente se destacam no enredo. Essa mudança no foco proporciona um bom respiro aos leitores que estão cansados de histórias sobre triângulos amorosos sem solução.

O fato de ter sido escrito por dois autores diferentes ajuda o livro a trazer dois protagonistas com personalidades completamente distintas, mas sem dar a impressão de que os traços psicológicos de um existem propositalmente para se contrapôr ao do outro. Quem já está acostumado com as histórias de John Green não terá dificuldade em perceber que ele é o responsável pelo primeiro Will Grayson apresentado. Já os capítulos narrados pelo Will Grayson de David Levithan são um convite a conhecer o trabalho do escritor, responsável por "Nick and Norah" (em parceria com Rachel Cohn), entre outros.

"Will & Will" foi publicado pela editora Galera Record. Para adicioná-lo à sua estante no Skoob, clique aqui.

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Argo

por Maria Clara

Em 1980, manifestantes iranianos invadiram a embaixada dos Estados Unidos naquele país e prendera, os norte-americanos como reféns. Seis diplomatas, entretanto, conseguiram se manter em liberdade, de modo que precisavam de uma forma segura de voltar a seu país natal. A missão da CIA que permitiu o resgate foi base para o filme "Argo", dirigido por Ben Affleck, e para um livro de mesmo nome, escrito por Antonio Mendez e Matt Baglio.

Mendez liderou a missão de resgate - ou exfiltração, como explica no livro. Chefe do setor responsável pelos disfarces dos agentes da CIA, ele organizou um cenário em que os seis diplomatas formavam a equipe canadense de produção de um filme. Assim, não levantariam muitas suspeitas se alguém decidisse questionar o que estavam fazendo no Irã. Para oferecer credibilidade, uma produtora foi criada e a mídia foi avisada do filme como se fosse uma produção real.

O livro mostra tanto os esforços do agente para cumprir sua tarefa quanto a situação em que os seus norte-americanos se encontravam - ao contrário do filme, o trabalho de preparação nos Estados Unidos ocupa a maior parte da narrativa, deixando apenas um capítulo para a exfiltração em si. A obra de Ben Affleck (que também atua, no papel principal) injetou certa dose de adrenalina à trama, talvez para agradar o público. Funcionou: o filme recebeu o Oscar de Melhor Filme, Melhor Roteiro Adaptado e Melhor Edição em 2013.


Antes de ser levada às telas e de ser publicada, a história já havia aparecido na revista Wired, que escreveu uma matéria sobre a exfiltração, e no livro "O Mestre do Disfarce", também de Antonio Mendez. Foi só depois de se tornar um roteiro de cinema de verdade que a missão ganhou um livro só sobre ela.

Matt Baglio foi responsável por entrevistar os seis resgatados, mas é Mendez que conta, em primeira pessoa, as decisões que tomou na CIA. Com isso, por mais difícil e delicada que tenha sido a missão, fica a sensação de que o espião não consegue disfarçar certo orgulho por ter sido o grande heroi. Ainda assim, vale a pena conferir a maneira como seis diplomatas, em meio a uma situação de crise onde a diplomacia não servia para mais nada, foram levados para casa em segurança graças a um esquema em que os iranianos jamais pensariam.

"Argo" foi publicado pela editora Intrínseca. Para adicioná-lo à sua estante no Skoob, clique aqui.

sábado, 11 de janeiro de 2014

O Momento Mágico

por Maria Clara

Jeffrey Zaslow, colunista do The Wall Street Journal, procurava uma forma de escrever uma história não-ficcional sobre o amor - em especial o amor que os pais dedicam a suas filhas. Seguindo um conselho da esposa, ele decidiu visitar a loja de vestidos de noiva Becker's Bridal, na cidade de Fowler, no estado norte-americano Michigan. O resultado é o livro-reportagem "O Momento Mágico".

Para escrever o livro, Zaslow acompanhou a rotina da loja e entrevistou sua dona, Shelley Becker, além de outros membros da família (a Becker's foi aberta em 1934 por Eva Becker e, desde então, é passada ao filho ou filha mais velho). A comerciante falou não apenas de sua experiência vendendo os vestidos, mas de seus relacionamentos e da forma como vê o amor.

As clientes que vão até a Becker's Bridal também conversaram com o autor. Elas contaram suas histórias de relacionamentos que não deram certo, expectativas para o futuro e a reação da família ao casamento. Com as entrevistas, Zaslow traça o panorama das mulheres que estão em busca do vestido perfeito e do sentimento que permeia a ideia do matrimônio.

O amor entre pais e filhas acaba dando um pouco do espaço do livro, também, ao amor que existe entre o casal de noivos, entre mães e seus filhos, e mesmo ao afeto demonstrado por irmãos e irmãs. Unindo as histórias das personagens a dados sobre casamento, Jeffrey Zaslow fez de seu último livro (ele morreu em 2012) uma forma realista de mostrar o amor e a forma como as noivas atuais percebem esse sentimento.

"O Momento Mágico" foi publicado pela editora Novo Conceito. Para adicioná-lo à sua estante no Skoob, clique aqui.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Divagações sobre o dia do Leitor

por Maria Clara

Ontem foi sete de janeiro e, fechando os primeiros sete dias de 2014, também foi Dia do Leitor. Ao invés de escrever um post celebrando a data, comecei a pensar: como tenho me comportado enquanto leitora? Como temos nos relacionado com a leitura?

Comecei a ler cedo e logo tomei gosto pela coisa: tinha livrinhos de borracha para ler no banho, contos de fada praticamente impressos em papelão para que fossem mais resistentes, livros que traziam efeitos sonoros e fitas-cassete com histórias narradas pelo Tony Ramos. Nunca fui obrigada a ler nada e acho que nunca me disseram que alguma obra era proibida. O resultado, hoje, é um ritmo de leitura frenético - não passo mais de oito horas sem estar envolvida com algum livro.

Quando entrei no Skoob e vi a forma como outras pessoas leem, comecei a analisá-las. Ainda na semana passada, um rapaz comentou por lá que devia ser possível marcar quantas vezes havia lido um livro, para aumentar seu Paginômetro.

Será que é assim que funciona para muita gente? O importante não é ler, mas ler mais que o colega? Num Brasil em que o nível de leitura é baixo, surge em mim o receio de que ler se torne apenas mais uma forma de ter status e trazer a sensação de superioridade.

Você leu 80 livros em 2013? Parabéns. Leu oito? Já é melhor que não ler nenhum. No fim das contas, ler é um prazer íntimo, individual (só não chega a ser egoísta porque, geralmente, um leitor tenta convencer os outros da maravilha que é uma determinada obra), e deve ser feito no ritmo e na disposição de cada um.

Por isso, mais que dar os parabéns atrasados a nós, que mergulhamos nas palavras alheias e nos afogamos entre páginas e enredos, desejo a todos mais possibilidades. Desejo que possamos ler quantos livros quisermos ou conseguirmos, sem nos sentir culpados por termos lido menos que o vizinho. Desejo que possamos assumir nosso amor por nossas obras preferidas, sejam elas clássicos da Literatura ou histórias de qualidade questionável. Desejo que possamos criticar qualquer livro, sem medo de estar dando início a uma briga sem sentido com os fãs. 

Desejo, enfim, que 2014 seja um ano em que possamos, cada um a seu modo, com seu ritmo, aproveitar a leitura.

sábado, 4 de janeiro de 2014

A Livraria 24h do Mr. Penumbra

por Maria Clara

"O que você procura nessas prateleiras?". Essas são as palavras que levam Clay Jannon, um designer desempregado em meio à recessão econômica nos Estados Unidos, a trabalhar na Livraria 24h do Mr. Penumbra. O local que dá nome ao livro de Robin Sloan não recebe muitos clientes, possui livros estranhos escritos num código ininteligível e parece funcionar como uma biblioteca para pessoas incomuns.

Ao abrir um dos livros do que chama de "acervo pré-histórico", Clay começa a entrar em contato com o grupo de leitores que vai até a loja para buscar e devolver as obras. Movido pela curiosidade, ele começa a investigar o que realmente se esconde por trás do estabelecimento de Penumbra, suspeitando se tratar de alguma seita. Aos poucos, com a ajuda de amigos, ele consegue desvendar alguns dos segredos que envolvem a loja.

O livro é permeado pela discussão sobre o uso da tecnologia na atualidade e a própria relação que as pessoas têm com a leitura (o uso de aparelhos como o Kindle é amplamente mencionado). Os personagens mais jovens são apresentados como sinais da modernidade, sempre com equipamentos eletrônicos. Já os clientes da livraria que têm acesso ao acervo pré-histórico, com mais idade, não se mostram desconhecedores da tecnologia, mas desconfiados. Eles sentem que estarão "traindo" sua organização - e, numa divagação mais ampla, a leitura de modo geral - se não prosseguirem com os livros, página por página, sem apelar para nenhum artifício eletrônico.

É fácil se envolver com o enredo e com os personagens - especialmente com Penumbra, que parece unir as gerações e as formas de ver tanto o mundo quanto os livros. Ao final da leitura, é provável que o leitor tenha se identificado com alguém da história ou repensado sua opinião sobre o valor dedicado ao universo dos livros hoje em dia.

"A Livraria 24h do Mr. Penumbra" foi publicado pela editora Novo Conceito. Para adicioná-lo à sua estante no Skoob, clique aqui.
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